domingo, 28 de fevereiro de 2010

CARTOGRAFIA ou de como pensar com o corpo vibrátil

Encontrar é achar, é capturar, é roubar, mas não há método para achar, só uma longa preparação. Roubar é o contrário de plagiar, copiar, imitar ou fazer como. A captura é sempre uma dupla-captura, o roubo, um duplo-roubo, e é isto o que faz não algo de mútuo, mas um bloco assimétrico, uma evolução a-paralela, núpcias sempre “fora” e “entre”.

Gilles Deleuze e Claire Parnet, Dialogues

“[...] o cartógrafo absorve matérias de qualquer procedência. não tem o menor racismo de freqüência, linguagem ou estilo. Tudo o que der língua para os movimentos do desejo, tudo o que servir para cunhar matéria de expressão e criar sentido, para ele é bem-vindo. Todas as entradas são boas, desde que as saídas sejam múltiplas. Por isso o cartógrafo serve-se de fontes as mais variadas, incluindo fontes não só escritas e nem só teóricas.”
O critério dele é basicamente relacionado à abertura sensitiva para a vida presente naquele momento específico, limitando-se apenas ao espaço dentro desse princípio. “O que define, portanto, o perfil do cartógrafo é exclusivamente um tipo de sensibilidade [...]”. O grau de intimidade permitido pelo cartógrafo é de caráter ilimitado, tanto variado quanto as sensações que o que ele visualiza pode lhe causar.
A análise pode ter as mais diversas versões e visualizações possíveis, provindo das ilimitadas sensações que o momento pode trazer. O cartógrafo pode absorver qualquer tipo de imagem, vibração e som como uma energia, e com essas fontes de informações adquiridas transformá-las nas em tudo aquilo que ele sentiu da forma mapeada mais perceptível possível.
“Implicitamente, é óbvio que, pelo menos em seus momentos mais felizes, ele não teme o movimento. Deixa seu corpo vibrar todas as freqüências possíveis e fica inventando posições a partir das quais essas vibrações encontrem sons, canais de passagem, carona para a existencialização. Ele aceita a vida e se entrega. De corpo e língua.
Restaria saber quais são os procedimentos do cartógrafo. Ora, estes tampouco importam, pois ele sabe que deve “inventá-los” em função daquilo que pede o contexto em que se encontra. Por isso ele não segue nenhuma espécie de protocolo normalizado.”
“Para que isso seja possível, ele se utiliza de um “composto híbrido”, feito do seu olho, é claro, mas também, e simultaneamente, de seu corpo vibrátil, pois o que quer é aprender o movimento que surge da tensão fecunda entre fluxo e representação [...]”
“Ela diz respeito à escolha de novos mundos, sociedades novas. A prática do cartógrafo é, aqui, imediatamente política.”


Notas sobre o texto de Suely Rolnik:
Cartografia Sentimental, Transformações contemporâneas do desejo, Editora Estação Liberdade, São Paulo, 1989.

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